Quem não gostaria de viajar pelo mundo por um ano e em troca escrever semanalmente sobre cada um dos 52 destinos visitados? Não é o melhor emprego do mundo? Foi com esta proposta dos sonhos que o jornal New York Times recebeu 13 mil inscrições no final de 2017.
Venceu a jornalista norte-americana Jada Yuan. Não se trata de uma destas blogueiras que registram selfies narcisistas à frente de pontos turísticos agregados a textos tão interessantes como bulas de remédio. (E geralmente roubados da internet, guias ou press releases).
Como Jada não foi assim. Nascida no Novo México, 39 anos, ela é formada em História pela Universidade de Yale. Obstinada, perfeccionista, é dona de um texto primoroso. Pesou na decisão dez anos de cobertura de cultura e entretenimento para a revista do jornal.
No ano seguinte, percorreu sem interrupções mais de 120 mil quilômetros, um terço da distância até a Lua. Ela registra sua passagem pelos mais distantes pontos do planeta. São os lugares mais inspiradores, intrigantes e sob risco, selecionados entre avaliações de jornalistas de turismo do mundo inteiro.
A escolha não poderia ser mais diversificada. Entre conhecidos e nada conhecidos, estão Basilicata, na Itália; Butão; Gangwon na Coreia do Sul; costa do Camboja; parque nacional de Liuwa no Zâmbia; Estônia; Kuelap no Peru; Kingali em Ruanda; La Paz na Bolívia, e Chandigarh, na Índia.
Diga-se de passagem, nem na seleção do ano passado nem na deste ano, recém anunciada, há qualquer indicação para o Brasil. Mais uma vez o nosso turismo foi minimizado como destino turístico. Mas isto é outra história…
Diferente do que a maioria pensa, a vida de Jada durante 2018 foi difícil. Mesmo com meticulosos cuidados no planejamento, apoio operacional do jornal, e sua experiência acumulada de campo, ela volta e meia enfrentou imensas roubadas.
Foram erros dignos de viajante de primeira viagem, fatalidades e contratempos, e frustrações. De gafes e choques culturais a transações financeiras equivocadas, quem ainda não passou por isto em suas viagens?
Ela conta que dormiu em motéis que cobram por hora, onde os ossos congelam de frio e os banheiros têm vaso sanitário e chuveiro no mesmo espaço. Alimentou-se de salgadinhos porque os restaurantes da cidade fechavam cedo. Ou ficou sem dinheiro onde só se aceitava pagamentos em dinheiro, e sem caixa eletrônico para socorrer.
“Tinha a impressão de que ganhara na loteria do jornalismo. Ia deixar para trás a rotina para nadar em cachoeiras australianas, voar de paragliding em montanhas suíças, ou comer em restaurantes estrelados pela Michelin na França. Consegui todas estas coisas. Mas também tive que encarar uma dura realidade. Fazer uma viagem contínua – e sozinha – em uma rota ilógica para a mente humana cobra um pedágio caro para o bem-estar físico e emocional”, Jada registra.
A jornalista tirou algumas lições de sua experiencia única. Por exemplo, é vital saber administrar a logística, que ocupa 60% das energias. E ter jogo de cintura para se adaptar aos imprevistos, que com certeza acontecem. “Cada país é diferente, com suas moedas, idiomas, ritmos de vida e diferenças culturais”, ela resume.
Para sobreviver a esta rotina desordenada, Jada explica que desenvolveu um “superpoder”. Capaz de enfrentar o medo de adoecer ou se ferir, ainda mais em localidades remotas sem assistência médica. Na prática, não precisou do seu kit de primeiros socorros, como aprendeu a se cuidar e até dormir com facilidade em qualquer lugar, sob as piores condições. Sobre segurança ela diz que é saudável ter cuidado, mas temor cego não é.
Outra conclusão: estar só não é sinônimo de solidão. Para ela, todo mundo deveria experimentar uma viagem sem companhia. “Eu posso ter voltado ao meu apartamento, mas o centro da minha vida não é mais lá. Ele está comigo, e é móvel”, conclui.
De todas as situações, a que mais ficará guardada na memória de Jada foram pequenas vitórias e conexões humanas. E a autoconfiança conquistada somada à certeza de a maioria das pessoas é do bem.