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Mesmo com os avanços da tecnologia, o atendimento dos call centers piora a cada dia. Isto muda se o foco for vender, como ocorreu com as companhias aéreas.

Quando foi mesmo que telefonar para um call center –  aquele atendimento telefônico despersonalizado das empresas que parece zombar do consumidor – virou sinônimo de pesadelo? A cortesia e prestação de serviço que sempre caracterizaram qualquer comércio deram lugar a uma modalidade que se caracteriza pelo má assistência e falso sorriso.

Este produto, que atende pelo nome genérico de call center, nasceu caricato. Desde o começo atendentes desprovidos de emoções pareciam recitar um script sobre um assunto que mal conheciam. Abusavam de gerúndios esquisitos, tipo “estaremos providenciando”, ou gravações hipócritas como “não desligue; a sua ligação é muito importante para nós”. Mas se isto já era ruim, conseguiu ficar pior. Na segunda geração dos call centers, há a substituição de gente por robôs que fingem ser humanos, só que são máquinas com a sutileza de um hipopótamo que pisa sobre um campo de margaridas.   

A situação soa familiar? Com certeza! Ninguém aguenta mais aquele linguajar eletrônico artificial que costuma oscilar entre o formalismo excessivo como se fosse copiado de um “almofadinha” resgatado do século 19, ou a irreverência só encontrada em diálogo de malandros. Não é para menos que uma pesquisa da Opinion Box realizada no Brasil concluiu que 52% dos consumidores que falaram com máquinas detestaram a experiência. E pior: no final do contato, mais da metade reclamou que sua solicitação não foi resolvida; 42% concluíram que o robô sequer entendeu o que foi dito; 26% chiaram da lentidão do serviço; e outros 26% desabafaram que a ligação caiu antes de finalizar o contato.   

Para fugir de tamanho descalabro comunicativo, nada menos que 70% dos entrevistados tendem a contatar no futuro empresas por canais tipo WhatsApp ou Facebook. Só que, num desconcertante paradoxo, a pesquisa revela que até hoje impera uma relação amor-ódio do consumidor com o telefone – ao mesmo tempo o canal mais usado e odiado nos contatos.   

O que isto tudo quer dizer? Do lado do consumidor, fica claro que ele prefere falar com gente de carne e osso, desde que reaja de forma natural, e não como papagaio de script. O problema está com as empresas, pois para elas é inviável economicamente atender de maneira individualizada milhares, e em alguns casos milhões de clientes. A não ser que a ligação sirva também de ferramenta de vendas.  

Na prática, o universo das centrais de atendimento convive com duas vertentes: as ligações que custam dinheiro e as que geram lucro. Ao primeiro grupo, que poderia ser chamado de “mal necessário”, é ofertado o suporte mais essencial e barato possível. Em geral é eletrônico, ou feito por seres que parecem lobotomizados. Estimulados a perder o menor tempo possível, os atendentes assumem o papel de inertes depositórios de reclamações, prestação de serviços não remunerados, ou captação de comentários. Já o segundo grupo merece das organizações todo o carinho, atenção e tempo necessário, pois representam cifrões e faturamento.

Por exemplo, eis o que ocorre nas quatro principais companhias aéreas brasileiras. Todo mundo lembra do horror do passado onde elas pareciam disputar o título de pior call center. Isto mudou e hoje são referência de mercado. Até decidiram contratar equipes próprias, em um mercado onde prevalecem terceirizações. O que aconteceu?

A GOL, numa louvável transparência na comunicação, é a que mais compartilha dados sobre o assunto. Explica ter 1.250 teleoperadores que responderam durante 2015 a mais de 1 milhão e meio de ligações.  Antenada aos avanços tecnológicos, a empresa cita também seus multicanais adicionais para o autoatendimento em aplicativos, site, e nos aeroportos. As concorrentes prestam informações a conta-gotas, já que as classificam como “estratégicas”. A Avianca diz receber 3 milhões de ligações por ano, enquanto a Azul e LATAM não revelam o movimento. A Azul apenas acrescenta contar com 800 funcionários próprios para o trabalho.

 A pista para entender este mistério chega de forma anônima por alguém que conhece profundamente o setor aéreo. É que os call centers viraram poderoso canal de vendas. Beneficiadas pela onda de desintermediação provocada pela internet, é no silêncio que abocanham, mordida a mordida, o lanche que no passado já foi exclusivo das agências de viagens. Com isto já acumulam em média 30% das vendas de passagens aéreas do país.   

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