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SORRISO FORÇADO - A decisão da Gol sobre o Smiles deixa investidores sem graça e satisfação de clientes no limbo.

A Gol foi muito criticada quando em 2007 comprou a Varig. Como pagar R$ 660 milhões por uma empresa decadente, com 17 velhas aeronaves que voavam só para 18 destinos? Junto com os aviões veio o Smiles, programa de fidelização criado em 1994.

Na época, ninguém deu bola ao penduricalho. Pelo contrário. Os programas de milhagem eram então vistos como ônus. Um mal necessário para conquistar a fidelidade dos clientes.

Tudo mudou quando os cartões de crédito passaram a valorizar as milhas. Os bancos viraram grandes parceiros, ao comprar pontos trocados pelos clientes por passagens aéreas.

ATRAÇÃO FATAL – a simbiose do cartão de crédito com programa de milhas é imã irresistível para o consumidor.

Diferente de outros mercados, como Estados Unidos, no Brasil os cartões de crédito não são associados a uma companhia aérea. Têm flexibilidade para transferir pontos para qualquer uma delas. Por isto, há uma briga de foice entre elas pelo mercado estimado em R$ 4 bilhões.

JOIA DA COROA

No caso da Gol, o Smiles se revelou a joia da coroa da aquisição. Cinco anos depois, ao abrir o capital da Smiles sem perder o controle, a Gol captou quase o dobro do que pagou pela Varig.

O mercado de capitais adorou. As ações da Smiles dispararam. Com 14 milhões de participantes, a empresa chegou a valer R$ 6,43 bilhões – mais que a própria Gol, avaliada em R$ 4,7 bilhões!

Até o fatídico dia 15 de outubro deste ano. Foi quando a companhia aérea anunciou a intenção de fechar o capital da Smiles. Na reorganização societária, informou que não iria renovar o contrato com a empresa de fidelidade, que vence em 2032.

O resultado foi bombástico. Da noite para o dia, as ações da Smiles despencaram quase 40%. Foi como se R$ 2,5 bilhões sumissem pelo ralo da especulação. O valor de mercado da empresa caiu para R$3,93 bilhões.

DINHEIRO NO LIXO – A decisão da Gol de fechar capital da Smiles evaporou R$2,5 bilhões em valor de ações

A FICHA CAIU

O que aconteceu? A Gol percebeu o conflito de interesses. O Smiles se tornou sanguessuga de companhia aérea. Os seus excepcionais resultados se alimentavam da operação da Gol, que não se beneficiava disto.

A Gol não está sozinha. Segue o exemplo de outras aéreas, como Air Canadá, Aeroméxico e LATAM, que também fecharam capital. Sem falar das concorrentes Azul e Avianca, que já nasceram e permanecem sob total controle das empresas-mãe.

Para piorar, o mercado se viu inundado por empresas de fidelidade não-aéreas, como Livelo e Sempre Presente. Surgiu também a venda paralela de passagens oriundas de pontos, como MaxMilhas. Isto significou raspar o tacho do inventário, antes boa parte perdido por não uso ou perda de validade.

Há alguns anos, a aviação estava em crise no Brasil. Nesta época de excesso de oferta, o Smiles ajudou a vender até 12% das passagens da Gol – o dobro de hoje. Só que o programa está crescendo e exige mais assentos. Tornou-se um fardo para a Gol, que não quer mais entregar tanto espaço barato.

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MERCADO FRUSTRADO

Nas palavras da jornalista Marina Gazzoni em excelente matéria em Seu Dinheiro, “quando a criatura ameaça o criador, é hora de trancá-la dentro de casa”. Foi exatamente o que a Gol fez com a Smiles.

A empresa tem muito a ganhar. Começa por maior eficiência tributária. O setor aéreo costuma dar prejuízo e acumular créditos tributários. Já o Smiles dá lucro, e paga cerca de R$ 200 milhões em impostos por ano. Sob as asas da Gol, a maior parte deste valor ficaria em seus cofres.

Além disso, esta é a oportunidade da Gol dar as cartas de como deve funcionar a conversão de milhas por passagens. Por exemplo, tornar barato resgates com antecedência e cobrar alto reservas de última hora. Com isto, oferece mais assentos ao cliente corporativo, que aceita pagar mais caro pela disponibilidade. Ou desobriga-se de disponibilizar à Smiles um percentual fixo das passagens a preços baixos, mesmo com demanda aquecida.

CRISE DE IDENTIDADE?  – Ao juntar as duas empresas sob um teto fica dificil saber o que é Gol e o que é Smiles.

Claro que o mercado financeiro não gostou. Em uma discussão que deve consumir tempo, sobraram a rigor duas alternativas. A primeira é conviver com uma ação da Smiles desvalorizada. A segunda é tornar-se compulsoriamente acionista da Gol.

“Os acionistas da Smiles dormiram sócios de um negócio ultra rentável, e acordaram sócios a fórceps de uma companhia aérea, um negócio com resultados ultra voláteis e retorno de capital baixo”, ironiza um investidor.

E O CONSUMIDOR?

A grande pergunta é como esta novidade afeta o consumidor que tem milhas. Aparentemente pouco, pois ele vai continuar a trocar pontos Smiles por passagens aéreas.

Com a faca e o queijo na mão, a Gol ganha autonomia e condições de igualdade com a concorrência para gerenciar preços e oferta. Claro que a empresa, hoje muito bem administrada, não é boba de abusar. Sabe que pode perder clientes e receita de venda aos bancos. Além disso, sempre haverá voos com assentos micados para negociar a preço de banana.

NOVO SÍMBOLO – Se depender do grau de irritação do mercado de capitais este poderia ser o novo logo do Smiles.

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